Pássaro Unitário

Pássaro Unitário

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

É tudo pose!


Vem o ano novo de portas e janelas abertas. Tiro o pó das botas enlameadas nos passos já trilhados. Sinto o perfume do sol que adentra sorrateiro pela vidraça acomodando-se sem cerimônia no tapete da sala. A vida sempre pode ser diferente do que um dia foi. O espelho mastiga meu semblante desenhando novos traços. Essa pausa que damos entre um ano e outro fere a materialidade do que teimamos em acreditar. Tantos caminhos trocados, tantas portas arrebentadas sem necessidade, tantos dias gastos com a ilusão de um mundo em pura pose.

Por essas horas todas as listas lotadas de desejos devem estar prontas. Rotas demarcadas a giz de cor por mãos trêmulas de necessidades. O mundo não muda. O mundo é a projeção que fazemos dele mesmo dentro do mundo inventado delineado dentro de cada um. Os projetos estão elaborados e intercalados no armário do sistema. Os planos não são nossos, são do espelho de mundo onde o aparelho social dita às ordens as quais obedecemos religiosamente como nossas.

Todo início de ano novo vem à velha máxima da felicidade, da paz, da saúde, do dinheiro... A canção pede o mesmo refrão cantado em voz única nos 360 graus do planeta. A fome de todos sacia a todos na frustração de deuses distantes, míticos e personificados em embalagens pré-fabricadas de tudo que nunca foi, mas é. A maior das angústias permanece sendo a corrida em busca da luz, seguindo o rastro descompassado da escuridão. Epicuro continua com a razão: O desejo é a causa de todos os males.

Talvez seja mais cômodo adiar a beleza. Prorrogar o silêncio. Dilatar a estrada do alcance a si em favor do imediato beijo do lupanar das alucinações modernas de um mundo caduco. 2012 acordou sorrindo inocentemente sem compromisso e foi pisoteado na porta da frente pela miséria nossa de cada dia. Cheia do egoísmo. Inundada de mínimos planetas batendo uns nos outros como cegos, que nem toda a luz do universo chega a clarear suas incertas certezas. E depois de tudo Dylan (Bob) há tempos alertou: A verdade do mundo vem de uma grande mentira. É tudo pose!

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