Pássaro Unitário

Pássaro Unitário

sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

Criptonita

Estamos envelhecendo debaixo do sol de criptonita.
Lírios alvos desidratam na lapela do meu blusão sem cor.
Jeans,
cabelos longos
e música rápida no rádio.
Mãos coloridas,
Céu de fim de mundo,
Malas leves.

Quando você preferiu ficar o relógio parou.
Restou a falta do próximo passo.
A esquina a ser dobrada.
Páginas brancas voando do outro lado da avenida.
A segurança te segura.
Te mantém fixa,
Estática,
Apagando raios de sonhos com colher de chá.

Estamos evaporando no tempo.
A matéria fecundada é bebida como areia na ampulheta.
Mandam-se cartas sem respostas para o queria ser.
Os bares cheios,
Os copos cheios,
A vida cheia.
Tudo tão cheio sem nada completar.

Poderia dizer eu te amor.
Mas como é que se diz eu te amo?

Desaprendemos amar.
E a chuva,
As ninfas,
Os amores,
O que poderia ser,
O que desistiu de ser,
Parecem tragar cânhamo
No horizonte das esquinas que nos impedimos de dobrar.

Flores de plutônio


Bebemos plutônio todos os dias.
Seguimos acreditando que a bomba atômica
Irá salvar a paz.
Nos banhamos em pólvora
E desejamos um copo com água limpa.
Somos nossa própria negação.
Nosso sim cheira a não.
Andamos perdidos em si e no outro.
Olhamos ao longe buscando salvação,
Desenhando paraísos,
Criando orações para nossos blefes.
Seguimos ignorando a fome,
A desigualdade,
A morte que ronda nossa caverna densa.
Seguimos fingindo não saber
Que somos nós que estragamos o mundo.

Teu adeus

Teu adeus me deixa sem alma
Planeta sem órbita no deserto do universo
Nuvem de chuva fria sem fim.

Talvez a noite passe
E as estrelas que caíram
Brotem do chão como rolimãs de cor azul.

Triste somos nós os homens
Presos nesse calabouço de carne
Vivendo a fantasia de amores esgarçados.

Quem sabe um tiro na testa.
Um salto livre das alturas.
Um copo transbordando de cicuta.

Qual a fuga mais eficaz?
O esconderijo mais seguro?
A distância que o vento não alcança?

Teu adeus me deixa sem saída.
Sem flores na lapela,
Sem tinta, pincel e aquarela.

Não encontro livro,
Música,
Nem mesmo poema.

Teu adeus me faz desacreditar da vida,
Da vida vivida aqui e agora
Da vida que nem sabemos que vida é essa.