Pássaro Unitário

Pássaro Unitário

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Revolução de Um Homem Só


Rendi a guarda da frente do Congresso
com meu estilete enferrujado.
Vim com fósforo na mão incendiar os códigos,
Enclausurar deputados,
Escravizar senadores,
Acorrentar a Presidência da República no tronco de todas as barbaridades.

Vim lacrar todos os gabinetes com o escarro podre
das mais abjetas dores inaudíveis.
Vim assombrar como um diabo vermelho
  a paz das famílias dos que se alimentam da guerra.
Vim rasgar com os dentes imundos o couro
dos que se cobrem de veludos e futilidades.

Vim estuprar a justiça classista abrindo seus olhos
com a lâmina fomentada nas lágrimas de todos os injustiçados.
Vim destituir com as próprias unhas cheias de lama
  a lei e a ordem que nos engana.
Vim assassinar cruelmente cada filho da riqueza
que não lhes pertence.

Minha marcha é reta e não se curva a dúvida das curvas.

Uso gasolina, querosene, álcool e até a dor atômica
de todo este planeta.
Uso o vírus, a bactéria, o fungo e até os mortos fatiados
pela ausência do Estado.
E mato, esfolo, exibo no mais alto Ministério
  o caos que senta a mesa dos sem mesa.

E não adiantar a sirene estridente,
O coturno batendo tambor,
O risco de fogo dos fuzis,
O argumento da ordem que nos mantém em desordem.

O telão do Congresso expõe ao vivo a morte ensanguentada
sob a trilha sonora das “metralhas”.
Gostaria de cortar a garganta dos três poderes.
Pois, o ventre é livre,
  Nossas vidas não. 

quarta-feira, 29 de maio de 2013

sábado, 25 de maio de 2013

De Passagem


Não tive tempo de regar as flores.
O perfume do cigarro acesso competia com as sobras do batom.
Nesses dias a neblina do sol cai como plumas de cinza.
Nesses dias o silêncio é um cão indomado mastigando a ausência.
Se for, foi para nunca mais voltar.

E os pulsos entregues a guilhotina é a última página do diário.
E as juras ajoelhadas de eternidades cabem no limite de cada história.

Havia um vestido azul, eu lembro.
Uns trocados no bolso do jeans rasgado,
Uns sorrisos enxugando copos de cerveja,
Uns olhares convertendo as sombras do próprio planeta,
E os amigos...
Ah, os amigos...
(A amizade é para aqueles que não fazem cálculos matemáticos).

E os dias afastaram-se sorrateiros como longas noites de sereno.
E as manhãs nasceram dos analgésicos da sobrevida que goteja do mundo.

Não tive tempo de regar as flores.
A noite chegou quando ainda era dia.
Continuo o mesmo menino magro da fotografia.
Alertando nos fósforos riscados dos versos vesgos de todo o poema
Que o bom da vida é o permanecer da passagem.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Pauta

... E a pergunta
Cuspiu seu fôlego por entre as frestas dos dentes do repórter:
- Saudades do que passou?

As rugas adormeciam sossegadas
No olhar que fitava o crepúsculo afogando no último rastro de horizonte.

- Não. 
(Respondeu sereno).
- Não sou mais esse. Sou este.
 

sábado, 11 de maio de 2013

Cemitério de Sonhos


As lápides enfileiradas.
Cada cova com mais de sete palmos de frustração.
O pio soturno da coruja em plumas noturnas.
O sorriso desdentado do coveiro envelhecido.
A ruga, o óbito, o verme amolando o talher no subterrâneo.

Tem a máscara de cera despetalada pelo perfume das flores.
Tem a oração repetida no assombro do jardim do fim.

A noite desliza ao som suave do violino de orvalho.
O vício de pernas cruzadas traga ao vento seu cigarro de cannabis.
O esquife rangendo o sexo úmido da dama dos sortilégios.
Cada dia com sua vela derretida na taça da mais bela escuridão.
O portão, a tranca, o mundo de costas de volta para casa.

Não falta a sirene nem a visita dos que nunca visitaram.
Não falta o cortejo nem a mão dos que nunca deram a mão.

O silêncio vestido em branco conversa com a ventania.
O cipreste sombreia de galhos secos a luz que exala do luar.
A ferida morta retira a casca para bailar com o frio.
De sepultura a sepultura o sonho mastiga chiclete de menta.
Pá de cal, vala comum, corpos deitados com a mesma epidemia.

Agora a chuva que vem se lança no meio do mar.
Agora a borboleta voa de volta ao casulo da lagarta.

O céu é comprido demais ao alcance curto do sonho que só sonha.
Azul é o berço de analgésicos onde dorme a fé de joelhos.
A mortalha cobre muito mais a vida que a morte.
Este luto que rodeia o olhar é o medo do próprio acabar.
A areia, o chão, o eco nos poros da terra pedindo para não respirar.

Cemitério de sonhos.
O gozo derramado na trepada da vida que pede morte.

quarta-feira, 1 de maio de 2013

Oferenda

Este verso
oferto
igual uma reza
de alento
em suave
ladainha
ao mundo
pintado
em sorriso 
no rosto
do palhaço triste
que equlibra
bolas no ar
quando o semáforo
ordena
que é hora
de você 
parar.