Pássaro Unitário

Pássaro Unitário

quarta-feira, 15 de junho de 2011

É de lua nova



Overdose de vida na lua nova que se inicia. A estrada peçonhenta dos sonhos frustrados é esquecida na calçada onde um mendigo bêbado vomita. Queremos os astros, a terra, o mar tudo que se compõe longe do que realmente é nosso. O poeta moribundo estava certo quando versificava em tom de desabafo profundo: "Gente nasceu para querer".

As estórias, os percursos se enlaçam e rolam dentro desse tapete vermelho de veludo alucinógeno, que nos conduz buscando sempre o supérfluo sucesso de um mundo fantástico, ilusório e sem chance de felicidade verdadeira. As vidas trêmulas em cada esquina que cruzamos nos dizem a todo instante, em um ruído gritante, que os rumos escaldantes do passo em descompasso de nossa sociedade apontam apenas para o desconforto.

Lua nova, vida nova no mundo de simplicidades. É a chuva cantando ao sabor dos ventos a melodia de um dia perfeito. Sem revoluções, sem disputas, sem quedas, sem o estrago hipocondríaco de uma vida de concorrências, desafetos e vitórias melancólicas completa de um nada eterno. Nossas mãos em contato com a epiderme da verdade. As fadas embriagadas cantando ao som do violino do deus Baco, dizendo em sussurros que viver é sonhar com amizades, amores, aventuras. É sonhar com o que temos a todo instante no nosso jardim de flores simples. É cantar no poema como uma pluma levada pela fluidez do ar: "Eu não preciso de muito dinheiro, graças a Deus".

O mundo exala sabores e desejos caninos, embalados ao som do caos pregado em nossas almas pela fonte violenta dos comerciais na TV. Desejamos em um eco uníssono os mesmo desejos de todos. É a cultura de massa que assombra nossas vidas tirando a corte de foice à criatividade e, principalmente, os atributos para formação de uma nova ideologia, aonde a vida se conduza ao espelho e se lance de encontro à felicidade. 

O viver se encontra distante dos abraços, dos gracejos, dos elogios desse sistema demente que trabalha para transforma o humano em máquina de fazer papel moeda. É o apelo de Drummond (Carlos) que clama em elegia: "Trabalhas sem alegria para um mundo caduco". É a máxima socrática que difunde a verdade do encontro com a felicidade a partir do pressuposto que diz quase em silêncio: "Conhece-te a ti mesmo".

Na verdade nada do que pregam que é preciso verdadeiramente se necessita. Os dias nossos de solidão, de angústia, de desespero matinal são reflexos da insatisfação dos sonhos gerados por uma massa sistemática assídua, que nos convence a persistir no erro de uma vida demente na busca infindável do que não temos. Somente a simplicidade traz a felicidade, a partir do instante que nos damos felizes ao percebemos a grandeza do nosso mundo interior e não temos mais a necessidade absoluta do que o sistema drogado de informações controvertidas nos diz.

O poeta Fernando Pessoa no poema "A Outra" inicia com os versos: "Amamos sempre no que temos o que não temos quando amamos". Numa alusão em carne viva as ações impetradas pelos homens quando somente ao longe está a felicidade verdadeira, que é frustrada a cada conquista desse mesmo longe, como uma ampulheta que trabalha eternamente em busca desesperada do inalcançável.

Lua nova batendo em nossa porta seus sinos de recomeço. É hora de dar um passo para trás. Reler estórias infantis. Buscar o desejo nas vidas que temos, nos móveis calados de nossa sala, nas pálpebras calejadas de quem sempre estar do nosso lado. Buscar o sonho na simplicidade eterna dos momentos, se dar feliz com cada grão soprado para nossas mãos. Ver o dia e a noite com olhos de humanidade. 

É Lua Nova que necessitamos. Violinos inebriando um novo tempo para quem sabe que viver é fluir ao sabor das sensações mais simples. É a voz que clama "é preciso amar". É o verso que alerta "a vida passa, a vida passa e amanhã não seremos mais o que somos hoje".

Nenhum comentário: